Anos Dourados

Por Ricardo Kimaid


O mercado de arte brasileiro, até o início dos anos 60, era por demais incipiente, onde o comércio predominante era para as obras de arte estrangeiras, ficando pouco espaço para nossos artistas. A partir daí, começou a tomar vulto, com o surgimento de novas galerias de arte e casa de leilões de artes: a Petiti Galeri, a Bolsa de Arte e a B75 passaram a incluir maior número de pinturas dos artistas nacionais em seus catálogos, e não raro, também realizavam mostras individuais e coletivas, fato que julgo ser responsável pela valorização desses artistas, e criando assim uma hierarquia, tanto de valor de mercado como de status desses artistas. No auge dos anos 70 e 80, o mercado de arte exibia certo glamour, onde seus profissionais eram vistos com certo fascínio pela sociedade. Os marchands eram recebidos como pessoas interessante, cultas e de gosto refinados.

 Lembro-me bem como as portas se abriam e as atenções se voltavam para um marchand, quando presente em reuniões sociais ou eventos culturais. Nós éramos diferenciados e vistos como mananciais da cultura artística para aqueles que queriam ingressar no convívio com as artes plásticas. Os salões de artes dos museus e centro culturais eram concorridos e a presença da sociedade era um manifesto de seu interesse pela arte.

Era patente a erudição dos profissionais do mercado: tanto nas antiguidades como nas artes plásticas, a cultura era imprescindível para aqueles que queriam o respeito e reconhecimento do público apreciador, dos críticos, curadores, e até da imprensa.

A presença dos marchands nos leilões ditava o tom do mercado, pois seus lances nas peças arrematadas tornavam-se parâmetros de preços, e orientava a sala sobre os valores de mercado das obras apregoadas.
A valorização do artista advinha do seu desempenho artístico e aceitação pelo público, críticos e o mercado em si. Havia certa hierarquia, não havia mágica. Quase sempre nossos ícones não desfrutaram da valorização de sua obra, uma vez que esse fato só acontecia após o seu desaparecimento. Aliás, isso era um fato histórico no mundo das artes plásticas.

Numa breve comparação com os dias de hoje, entenderemos porquê o mercado de arte transformou-se nessa mixórdia. Qualquer aventureiro bota um quadro debaixo do braço, abre uma galeria, ou uma casa de leilões e se estabelece. A figura do verdadeiro marchand desapareceu, a figura do crítico de arte não mais existe, e os centros formadores de opinião, como os museus, centros culturais e as bienais estão a serviço de confrarias sabe-se lá de que origem. A verdadeira arte, os verdadeiros artistas foram condenados ao esquecimento, da mesma forma que a cultura foi jogada na sarjeta. Hoje, o que importa é o rótulo, e não o conteúdo. A arte tornou-se grife, é moda, tão perecível quanto o mau odor que ela exala.

Com isso, as novas gerações não têm referenciais que lhes orientem, e ficam completamente a mercê da mídia, seu verdadeiro tutor cultural, não por escolha, mas pela falta do que se lhe apresentam de substancial.
Nós, remanescente daquelas gerações, só temos por ansiar pelo estouro dessa "bolha" criada no  mercado de arte, o que certamente acontecerá em breve tempo, para desinfetar seus resquícios e reviver esses áureos tempos.

rkimaid@uol.com.br




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