Ricardo Kimaid
Então, essa é a receita para se tornar um famoso artista
contemporâneo, anote aí: pega-se qualquer objeto, de qualquer forma, de
preferência que não prestará para mais nada, e mão na massa. Exclua
absolutamente seu significado, e depois acrescente um treco qualquer, de
preferência alguma coisa inusitada; torce e distorce até não representar algo
identificável. Feito isso, adicione pregos, parafusos enferrujados, sola de
sapato, e depois bata, envergue, e dê alguns chutes até machucar o pé; afinal
de contas essa será a prova de sua autoria na porcaria que você acaba de fazer.
Feito isso, procure algum cara enturmado com alguém
que trabalhe com um jornalista de um grande jornal, para que o mesmo veja a
maravilha de obra que você criou, mas não se esqueça de forjar um currículo
farto de historinhas imaginárias, como por exemplo: a existência de museus
europeus que há dois anos tentam adquirir seus trabalhos, mas como você só
produz meia dúzia de obras por ano, a fila está crescendo, e fica difícil
atender a todos.
O próximo passo é procurar um Curador, aquele cara
do tipo que consegue falar mil palavras e não expressar absolutamente nada.
Esse cara é importante para explicar o seu trabalho para os trouxas que poderão
vir a se interessar por ele, e de preferência um daqueles que estiverem
enturmado com as casas leiloeiras, principalmente os da Europa e EUA, para
colocar um trabalho seu no leilão. É importante arranjar meia-dúzia de amigos e
mandar lançar na sua obra até alcançar um preço absurdo; a partir daí cria-se
um parâmetro de valor fictício para futuramente engabelar os desavisados. Vai ter
que pagar a comissão, mas vale a pena, pois quando a notícia chegar aqui, na
república de bananas, os novos ricos e os endinheirados entram em alvoroço para
ser o primeiro a comprar suas bugigangas, pagando rios de dinheiro.
Ah, esqueci-me de dizer que, vez por outra,
organize uma exposição individual num lugar bem bajulado, anunciando que trará
obras de sua autoria, de coleções importantes e museus internacionais. Não
deixe de frisar que nenhuma delas estará à venda. A mídia vai espalhar nas
colunas sociais, nas revistas de celebridades, que frequentam as mansões de
todos os panacas que adoram ser fotografados pelos paparazzi suburbanos.
Feito isso, é só esperar; vais começar a ganhar
muita grana vendendo suas quinquilharias, mas preste bem atenção, trate de
guardar o dinheiro que você ganhar com essa mutretada toda, pois logo logo vão
aparecer outros iguais a você, e quando a ficha vai cair, vai ser dureza encarar
a realidade.
Minha gente, procurei ilustrar com um pouco de
humor, como andam as coisas no mercado de arte. A bem da verdade, qualquer
semelhança não será coincidência; é por esse caminho que criaram essa situação
esdrúxula em que atualmente se encontra o mercado de arte. Ao abrir os
catálogos de alguns leilões, os lotes dos contemporâneos são verdadeiros
dejetos culturais, sem pé nem cabeça, com avaliações estelares, e os mesmos
ocupam 70 a
80% das peças a serem apregoadas. Esse mercado se tornou uma indústria
mercantilizada, que necessita vorazmente de produção e renovação para atender
uma demanda de negócios que alimente essa bolha que um dia vai estourar; é a
pirâmide construída de cima para baixo, e equilibrada pelo cume; o tombo será
inevitável; já vimos esse filme algumas vezes.
Ao findar mais um ano, ensejo que 2014 nos tragam
mudanças alvissareiras nesse cenário tão degradado culturalmente, com o alento
de que o cidadão pare um pouco para pensar e raciocinar o quanto ele é
manuseado por esse turbilhão que nos conduzem a tal ponto que faz-nos esquecer
de preservar os valores fundamentais que nortearam nossa formação cultural.
Boas festas, feliz Natal e um próximo ano novo
repleto de paz e saúde para todos nós.
tel 21 2273-3398
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