A Rebimboca da Parafuseta

                                               Ricardo Kimaid

   Há muito preparei esse artigo, em reação a um artigo publicado sobre a artista plástica Adriana Varejão, em página inteira do jornal "O Globo" de domingo e, pouco tempo depois, a Globo News dedicou uma reportagem considerável sobre, segundo nossa imprensa, uma das mais importantes entre os principais artistas brasileiros.
   Desta feita, vou me desviar dos méritos que lhe prouveram tal importância, e a pertinência do proposto contidos nessas reportagens, fazendo breve considerações sobre o diálogo entre entrevistadora e entrevistada. Pode parecer que estou sempre de espírito prevenido quando trato desses assuntos referentes ao atual quadro patético do mercado de arte. A mídia embota o cérebro das pessoas, imobiliza seu raciocínio, dizima qualquer sentido crítico. Parece, cada vez mais, que o ser humano parou de pensar, acomodou-se e não reage ao que seus olhos deveriam enxergar como discrepâncias, e embarcam nesse mundo aculturado proveniente das telinhas de TV.
   Mas, voltando à reportagem, a entrevistadora Bianca Ramoneda propõe um diálogo surreal com a artista sobre sua obra, cujas perguntas e respostas viajam em nuvens metafóricas, e, como eu não  uso cannabis sativa para embarcar nesse delírio, fiquei apenas com a perplexidade.
   Minha gente, nada contra a artista, suas opções de técnicas ou como ela vê e se inspira para realizar seus trabalhos. Há mercado para as diversas  tendências, e eu respeito isso. Gosto não se discute, mal gosto, lamenta-se! Tampouco estou direcionando minhas críticas pela escolha de cada um. O escopo de minha discordância, refere-se à idolatria nutridas de superficialidade, a generalizada  insanidade cultural promovida pelos os veículos de comunicação, criando super stars, mitos, modas, costumes e tendências. É o verdadeiro canto da Sereia, que hipnotiza a humanidade, cada vez mais desprovida do sentido de lucidez.
   Em dado momento da entrevista, a artista cita Iberê Camargo e Goya como inspiradores. Ótimos nomes, mas tão distantes exemplos, e, em se tratando de inspiradores para suas obras, absolutamente não tem nada a ver! Conheci Iberê, e conheço sua obra e em todas as suas fases, sinceramente não encontro nada que identifique a artista com seu inspirador, a não ser, talvez, o uso abundante de matéria em alguns dos seus trabalhos. Mas isso não vem ao caso. Se analisarmos toda a trajetória da vida e obra de Iberê, chegaremos a triste conclusão que as melhores obras desse artista, cujo acervo encerrou-se há mais de 20 anos, jamais encostaram, em valores de mercado, às cifras perto de R$ 3 milhões alcançados no leilão da Christie's de Londres, segundo ela e os veículos de comunicação, fato que me reservo o direito de desconfiar de sua veracidade. Quanto a Goya, bem, nada a comentar!
   Outro trecho da entrevista que achei hilário foi a explicação que Adriana faz ao dar nomes às cores da sua palheta, gostei muito da designação "cor de burro quando foge"; fantástico!
Faz-me lembrar a tal "rebimboca da parafuseta" usada pelo mecânico para definir um problema no motor do carro.
   Pois é, meus amigos, é assim que se põe um nome no pedestal da fama. A imprensa não se preocupa em colocar nos seus quadros de jornalismo e entrevistadores pessoas com erudição notória para discorrer sobre os temas que abordam, e por conta disso, certas entrevistas chegam a ser hilariantes, se vista por alguém com o mínimo de cultura sobre o mundo que envolve as artes plásticas.As aberrações se multiplicam, e, por incrível que pareça, elevando o status do entrevistador e do entrevistado. Em determinadas vezes, se levarmos em conta o produto do diálogo entre eles, chegaremos à conclusão que seu conteúdo não daria para encher uma caixinha de fósforo. Mas infelizmente, é o que fica, embora por pouco tempo, pois a fila anda e a mídia tem que vender novos produtos.
   Finalizando, que deixar claro que até aprecio alguns trabalhos de Adriana Varejão, e minhas dissonâncias são em relação à sua posição no ranking dos artistas plásticos brasileiros, que alguns querem colocar; longe da realidade, cujo objetivo principal são interesses mercantis entre patrocinadores e a mídia nesse conluio.

Ricardo Kimaid
rkimaid@uol.com.br

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