O efeito Cintra

Única galerista carioca participante do comitê de seleção da ArtRio – Feira Internacional de Arte Contemporânea, Juliana Cintra deu uma entrevista a um jornal de grande circulação, onde desancou as galerias de arte do Rio de Janeiro. Disse, entre outras coisas, que as galerias do Rio não tinham nível para participar da feira. Afirmou que muita gente caiu de paraquedas no mercado de arte, chamou uma meia dúzia de mentirosos e outros de semi-analfabetos.

No final das contas, o número de galerias do Rio de Janeiro que participou do evento ficou igual ao número de galerias de São Paulo, o que demonstra que o número de galerias sem nível do Rio, não é assim tão grande. O problema é que, com sua entrevista, Juliana Cintra expôs diversos problemas do mercado de arte que muita gente sabe que existe, mas não divulga. Problemas que vão desde preços inflados, passando por informações erronias, chegando até procedência e autenticidade.

O comitê de seleção da ArtRio foi extinto no primeiro dia da feira, num bafafá não explicado. O que ficou foi a certeza que galerias sem nível realmente existem, não só no Rio, como também nos outros estados e até no exterior, como provam algumas galerias estrangeiras presentes ao evento. Numa delas, um conhecido colecionador brasileiro foi repreendido por jogar um copo descartável de café numa caixa, que ele pensava ser para lixo, mas na verdade era uma “obra de arte”.

Mas, essa “falta de nível” não se resume apenas a obras de arte duvidosas ou superavaliadas. Faltam a muitos donos de galerias de arte competência, conhecimento e capacidade de catalogar, identificar e avaliar obras de arte, e, principalmente, oferecer ao comprador uma “expertise” segura. E são esses, justamente esses, os mais incompetentes, que exibem uma pose característica do mercado, que é o “nariz em pé”. Olham para você com um ar de superioridade tão grande, que você se sente um
inseto.

Lá fora, as casas de leilões, galerias e museus se utilizam dos serviços de profissionais altamente especializados. Um deles é especialista em arte moderna do século XX, o que já é muita coisa, outro em pintura da Escola Veneziana, outro nos Impressionistas, e por aí vai, chegando ao requinte de existir um especialista apenas para um determinado artista. Ou seja, o cara estuda a vida toda para identificar as obras de um único pintor.

Aqui no Brasil, com raras exceções, o marchand ou galerista se arvora a emitir parecer sobre obras de artistas desde a Missão Francesa, pintores viajantes, passando pelos modernistas e outros “istas” até as obras de arte contemporâneas. Se existisse mesmo alguém com essa capacidade, este sim, teria o direito de andar com o “nariz em pé”. Mas não existe. O que existe são práticas condenáveis, como por exemplo, depreciar as obras do concorrente, ou alguém aqui desconhece o famoso parecer: “O quadro não é bom!”; ou então pior: “Não gostei!” Não gostou de que cara-pálida, do estilo, do tema, da paisagem, da técnica, das cores... ? Mas não, esse simples “Não gostei” planta uma dúvida na mente do comprador e às vezes condena sem apelação uma obra de arte.

Claro que aqui existem muitos leiloeiros e galeristas criteriosos, corretos e honestos, que se preocupam em estudar, avaliar e determinar a procedência e a autenticidade das obras de arte antes de colocá-las no mercado. Mas não estamos falando desses excelentes profissionais.

Este artigo é sobre os outros, os galeristas “sem nível” de “nariz em pé”.

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