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Fontes d'Art - Elo cultural entre a França e o Brasil

Por José Francisco Alves*

Mulher com Lira, Largo dos Leões - RJ
No século XIX, a França levou a cabo um produto cultural muito específico para a cidade moderna haussmaniana, com o objetivo de ornamentação do meio urbano, em especial as praças, parques, bulevares, edifícios e mansões, por meio de chafarizes, estátuas e objetos variados: a indústria das Fontes d'Art.

 Como Paris era tida como referencia para o mundo ocidental, seus exemplares dessa indústria cultural passaram a inspirar as urbes de vários continentes, em especial na América do Sul, as quais passaram a desejar essas obras de arte para europeizar seus espaços públicos, o que significava afrancesar tais locais. Essa produção artística de elementos decorativos e dos mais diversos "equipamentos urbanos" (de luminárias a mictórios públicos) surgiu em função do desenvolvimento de um sistema industrial criado por determinadas fundições especializadas no ferro fundido, as quais destacaram- se as localizadas na região de Champagne-Ardenne, nordeste francês. Essas fundições contavam com excelentes condicionantes, como a disponibilidade dos materiais (carvão para os fornos e água corrente), a tecnologia avançada, e, principalmente, a qualidade de artistas e artesãos formados pelo sistema de arte francês.
Estátua Crepúsculo - Fundição Val d’Osne - Biblioteca Pública do RS
Dentre as fundições mais destacadas que existiram podemos citar Val d'Osne, (em Osne-le-Val) e Durenne (em Sommevoire). As fontes d'art - cujo termo designa basicamente os materiais fundidos em ferro [fonte de fer] - vieram para o Brasil entre a segunda metade do Séc. XIX e as primeiras décadas do Séc. XX, em contextos diferentes, porém inter-relacionados. Enquanto na década de 1860 o Rio Grande do Sul recebeu para Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande nada mais nada menos do que treze chafarizes de grandes dimensões (das Fundições Durenne), com o objetivo principal do abastecimento de água potável, o Rio de janeiro recebeu centenas de peças para o embelezamento de espaços públicos e privados (com maioria de peças originada nas Fundições Val d'Osne). E é justamente a cidade do Rio de Janeiro o lugar considerado como o detentor da maior coleção dessas peças fora da França, embora tenhamos um elevado número dessa produção em cidades como Buenos Aires, Santiago, Montevidéu e Recife.
Nas últimas duas décadas, as Fontes d'Art na América do Sul tiveram a sua importância renovada como patrimônio cultural e artístico a partir da ação da ASPM (Association pour la Sauvegarde et la Promotion du Patrimoine Métallurgique haut-marnais), sediada em Saint-Dizier, França. Em 1995, foi dado o primeiro passo nesse sentido, com a exposição "Fontes de Arte - estátuas e chafarizes franceses", na Casa França-Brasil, em promoção da Prefeitura do Rio de Janeiro e Consulado Geral da França, com a participação da ASPM. Logo em seguida, foram realizados, sob coordenação da ASPM, simpósios com convidados de vários países, técnicos e especialistas franceses, em parceria com prefeituras e Embaixadas da França: Rio de Janeiro (1997), Buenos Aires (2003), Santiago (2005) e Montevidéu (2007).
As peças da cultura das fontes d'art têm habitado o universo do comércio de artes e antiguidades e é preciso atenção na correta identificação das peças. No site da ASPM [www.fontesdart.org], podem ser encontrados fac-símiles das pranchas dos catálogos produzidos pelas fundições, os quais ajudam bastante nas atribuições. A ASPM, na busca de aprimorar o inventário dessa produção, também têm solicitado o envio de imagens de peças por interessados, com vistas à catalogação. A identificação das peças da Fundição Val d'Osne é mais comum em razão das etiquetas que comumente eram afixadas na base de estátuas, chafarizes, candelabros, etc. Mas lembramos, enquanto nessas etiquetas a menção de origem era 'Paris', essa era em verdade uma estratégia de marketing, uma vez que as fundições eram localizadas bem longe da capital francesa.
Estatua Candelabro da Fundição Val d' Osne Biblioteca Pública - RS

*Doutor em História da Arte, Professor de Escultura e Curador-Chefe do MARGS. Representante no Brasil da ASPM


Esculturas francesas no Rio de Janeiro
O inicio da utilização das esculturas em ferro no Rio de Janeiro está ligada à modernização da cidade. O Rio que acolheu D. João VI e a família real, em 1808, cercados de outras 15 mil pessoas que fugiam da invasão dos exércitos napoleônicos a Portugal, tinha até então apenas 50 mil habitantes. Na onda de transformações para adequar a cidade nova às novas necessidades de características de sua população, o Rio recebeu, em 1816, a Missão Artística Francesa, contratada para transformar a corte tropical. A influência francesa passou a ser uma marca nos anos que seguiram.
As fontes e chafarizes são um testemunho das novas necessidades estéticas. Até 1870, o abastecimento de água do Rio de Janeiro era feito pro bicas, fontes e chafarizes. Se, a principio, estas peças tinham meramente fins utilitários, com a transformação da cidade elas foram se tornando também ornamentais e a grande maioria das peças em ferro fundido passou a vir da França.
A presença de um grande número de esculturas em jardins públicos e particulares é atribuída à chegada do botânico e paisagista Auguste François Marie Glaziou que, a convite de D. Pedro II, chegou ao Brasil em 1858 para reformar o Passeio Público. Glaziou passou a fazer também o projeto de parques, praças e jardins para palácios e residências e a utilizar as obras de arte em ferro fundido - que estavam no auge da moda na Europa - como adorno.

(Colaborou Maria Helena Esteban)


Detalhe de Chafariz francês Fundição Durenne – Pelotas
 Alguns locais onde se encontram as Fontes d'Art no Rio

Passeio Público
O jardim projetado por Glaziou tem traçado inspirado nos jardins ingleses, em estilo romântico, com alamedas sinuosas entre gramados, riachos e lagos. A pequena ponte que cruza o lado lago e parece feita de galhos de árvore na verdade foi fundida em ferro e é o único exemplar no Rio de Janeiro. No Passeio Público também estão três estátuas alegóricas de Mathurin Moreau: a Primavera, o Verão e o Outono.

Campo de Santana
O jardim, inaugurado em 1880, também foi projetado por Glaziou. As esculturas a Sereia – que emerge das águas trazendo nas mãos um peixe – do escultor Serres, e as fontes do tipo Stella adornadas com o busto de Europa, de Marthurin Moreau e encontradas nos quatro cantos do parque são apenas mais uma atração.

Igreja da Candelária
As três portas de entrada da igreja, obra do escultor português Teixeira Lopes, foram fundidas em bronze, na França.
Lequesne

Praça Estado da Guanabara
Próximo ao Largo da Carioca está a fonte o Amor à Lira, de Eugène Louis


Chafariz francês
Monroe - Rio de Janeiro


Jardim do Monroe – Cinelândia
O Chafariz Monumental do Jardim Monroe foi comprado por D. Pedro II, em Viena para ser instalado na Praça XV, em 1878. O Chafariz possui uma peça circular em cantaria e várias taças de ferro fundido entremeados de alegorias. No Centro, uma base ornamentada apóia um grupo de estátuas de crianças representando a América, a Europa, a Ásia e a África.








Ruas Primeiro de Março e Dom Manuel
No Prédio do Supremo Tribunal Eleitoral estão as estátuas de Marthurin Moreau que representam a Agricultura, a Marinha, a Indústria e o Comércio e no prédio da Procuradoria do Estado do Rio de Janeiro estão duas estátuas: a Ciência e uma obra alegórica mostrando um jovem com os símbolos característicos da Indústria.

CATETE

Museu da República
No interior do prédio estão quatro candelabros e o busto que representa a República. Na varanda externa, utilizadas para a iluminação, estão a Aurora e o Crepúsculo. Nos jardins encontramos o chafariz o Nascimento de Vênus, uma peça que na verdade foi confeccionada no ano de 1854, e que a princípio foi instalada no Largo do Valderato. Também nos jardins estão as estátuas que representam os cinco continentes: América, Europa, Ásia, África e Oceania e ainda uma escultura de Cristóvão Colombo. Todas as peças são de autoria de Marthurin Moreau.

Faculdade Souza Marques
Logo na estrada à esquerda, está a estátua Atlanta, de Lepautre. No mesmo prédio estão duas escadas de ferro que foram construídas de forma simétrica. Os corrimões são sustentados por carrancas e as pilastras de apoio são formadas por quatro estátuas de meninos. Do outro lado do prédio está a estátua de Hipômenes que traz na mão uma maçã de ouro e foi esculpida por Coustou.

CATETE/GLÓRIA

Hotel Novo Mundo e Hotel Glória
Na Praia do Flamengo, guardando a entrada do Hotel Novo Mundo estão dois leões. São peças do escultor animalista Jacquemart. No interior do Hotel Glória há uma estatueta de um menino.

LARGO DO MACHADO

Colégio Estadual Amaro Cavalcanti
Na fachada, ao alto, estão quatro estátuas que representam: a Ciência e a Agricultura, de Mathurin Moreau, e a Arte e a Indústria. Na entrada, o portão de ferro está ornamentado com dois vasos.



Chafariz Fundição Val d' Osne
da Praça São Salvador
Laranjeiras - Rio de Janeiro

Praça São Salvador
Nesta praça está um chafariz decorado onde chama a atenção a figura de uma mulher que verte água e está localizada ao alto de um conjunto. A base é formada por crianças sobre golfinhos e a água jorra em tanque de granito.









LARANJEIRAS

Palácio Laranjeiras (Parque Guinle)
No meio do jardim do Palácio Laranjeiras está um chafariz com a estátua do deus Mercúrio que traz nas mãos a vareta mágica divina (caduceu), entrelaçada pelas duas serpentes da sorte.

Palácio Guanabara
Nos jardins do palácio está o chafariz Netuno, o deus do mar, de Dubray. Netuno é representado por um tridente na mão e rodeado de crianças montadas em delfins.

JARDIM BOTÂNICO

Em meio ao delicioso passeio pelas aléias do Jardim Botânico encontram-se a Fonte, de Louis Sauvageau, moça com a Concha, de Pierre Loison e ainda seis fontes do tipo Stella, de Lebourg, espalhadas pelo jardim, que se caracterizam por ter o frontão ornamentado com uma cabeça de mulher.

GÁVEA

No Museu da Cidade do Rio de Janeiro, no Parque da Cidade, estão as estátuas Índio – tocheiro de Jules Salmson – e Lampadário – de George Clère.

HUMAITÁ

No Largo dos Leões, no Humaitá, está a pequena estátua Harmonia, de Pradier. A Harmonia é representada por uma mulher com uma lira e foi popularmente batizada de Bica da Mulata.

URCA

As estátuas conservam até hoje o pedestal original, todo ornamentado.

Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
O prédio localizado na Av. Pasteur tem estilo neoclássico, com elementos de características greco-romanas e hoje pertence à CPRM. Lá estão as estátuas a Aurora e o Crepúsculo. No alto da escadaria do hall está a estátua candelabro Negra. Todas as peças são de Marthurin Moreau.

OUTRAS PEÇAS

Hospital Souza AguiarNo hospital existem duas enormes estátuas: Esculápio, que na mitologia grega é o deus da medicina, e Hígia, a filha de Esculápio e representante da saúde.

Centro Cultural José Bonifácio, Gamboa
No telhado e ladeando a escadaria existem obras representando a Arte, a Indústria, a Ciência e a Navegação, além de duas estátuas segurando lampiões. No interior do prédio está Negra, uma peça de Moreau.

Praça Santo Cristo
Em Santo Cristo está o chafariz a Fonte da Criança, de Henri Frédéric Iselin.

Auguste Martin

Rio CompridoNa Praça Condessa Paulo de Frontin está um chafariz de Floresta da Tijuca e Santa Cruz: Tanto no Jardim dos Manacás como Praça Dom Romualdo encontra-se uma fonte Wallace. Estas fontes apareceram em Paris em 1872. As fontes chamam a atenção pela harmonia das quatro figuras femininas colocadas em sua base que representam a Bondade, a Caridade, a Sobriedade e a Simplicidade.

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