Por
Ricardo Kimaid
Próximo a
completar um ano de inauguração da ArtRio - Feira Internacional de
Arte Contemporânea, e às vésperas de sua nova edição, agora em
setembro, não ficou claro para mim e muitos outros profissionais
atuantes do mercado de arte brasileiro, de como essa feira foi
concebida.
Apesar de
haver cultivado durante anos essa ideia de criar e participar na
construção desse tipo de evento aqui no Rio, motivo pelo qual
enderecei carta fazendo tal sugestão através deste jornal ao
Prefeito Eduardo Paes, no início de sua gestão, vejo com muito bons
olhos sua realização, mas não pela forma obscura com que me
pareceu sua construção.
Um fato
intrigante abre uma prerrogativa de que a indicação para receber
tal presente esteja ligada a favorecimento de amigos, ou pior,
interesses escusos. Baseado em um apanhado de relatos, deduz-se que a
criação da ArtRio assemelha-se a um conto de fadas: duas ilustres
desconhecidas, uma artista plástica de cujas obras ninguém ouviu
falar, e outra, esposa de um galerista, elaboram um projeto, vão à
prefeitura e saem com um cheque de R$ 1 milhão na mão. Simples
assim: o secretário de Turismo da Prefeitura Municipal do Rio de
Janeiro entrega um milhão de reais, dinheiro do povo, sem licitação,
para viabilizar a realização de um evento privado que visa o lucro.
Na
apresentação da 1ª ArtRio à imprensa, na sede da Prefeitura em
Botafogo, o próprio secretário disse: "Estas duas mulheres
estiveram na prefeitura várias vezes para me convencer, mas valeu a
pena. Saíram com um milhão". Pergunta que não se cala: valeu
mais a pena para quem?
Não se
sabe se o espaço onde ocorre a feira foi alugado, cedido ou doado. E
logo o Estado, que normalmente é ávido por impostos, isentou de
ICMS as vendas realizadas durante a feira, agraciamento esse que a SP
Arte, com sete edições, jamais havia obtido em São Paulo. Que
prestígio tem essas duas senhoras! Com tanto empenho do Município e
do Estado, paira uma dúvida no ar: trata-se de um evento privado ou
da Prefeitura?
Outro fato
que me causa espécie é o surgimento de investidores depois de tudo
montado e pronto: Luiz Calainho e Alexandre Accioly compraram parte
do negócio, injetando mais dinheiro; será que surgiram novos
mecenas no cenário das artes plásticas brasileiras?
A bem da
verdade fica patente que se criam Cortes para comandar eventos dessa
natureza, que quase sempre não possuem o devido pedigree, prático
e histórico para organizá-los. Pessoas que não são amparadas por
um currículo sustentável de prática, experiência e o mais
importante: uma cultura abrangente sobre a história das artes
plásticas, no Brasil e fora de suas fronteiras. Sua linhagem
cultural é insípida para os clamores que a abrangência de um
evento de tal envergadura preconiza. Vêem-se pessoas no comando de
tarefas desqualificadas para exercê-lo, sem a devida experiência e
preparo para tal atribuição, colocadas ali unicamente por fazerem
parte de alguma tribo, sem currículos que justifiquem suas
indicações. Exemplo disso é a nomeação dos seus curadores, cujos
atributos são imperceptíveis a qualquer análise, por mais
condescendente que seja. Daí observa-se que as seleções para
inclusão dos participantes e expositores estão em mãos
despreparadas ou tendenciosas, regidas unicamente por um regime de
compadrios.
Na
verdade, somente enxergam o que está constrito nesse mundinho atual
de arte contemporânea, que por ser a mesma vazia de conteúdo, não
exige muito apelo cultural. Feiras tipo a ArtRio e as Bienais,
deveriam ser eventos que promovessem as artes plásticas em toda a
sua magnitude, sem preconceitos, deixando unicamente ao sabor do
público suas escolhas e avaliações. Muito pelo contrário, impõe
as novas gerações como opção única, o que apraz seus
organizadores e adeptos de sua doutrina. Seria medo das gerações
vindouras aprenderem a gostar do agradável, do inteligível, do
interpretável? Seria receio de vê-las apreciando a beleza, a
poesia, refinando sua sensibilidade e enriquecer-se culturalmente?
Finalizando,
a coincidência com a data de inauguração do Museu de Arte do Rio,
vizinho próximo a ArtRio, vai deixar então as tribos em polvorosa;
vai rolar muita grana para os especuladores de plantão, aqueles que
só embarcam nas boas bocas, e muito oba-oba em época de eleições.
Quanto à arte em si, objeto maior desses acontecimentos, isso é um
mero detalhe, e, portanto... deixa pra lá.
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