Em cada casa um
oratório, em cada quintal uma oficina
Batina usada pelo “Padinho” |
Até o dia 19 de agosto
fica em cartaz a exposição "Meu Padinho Padre Cícero - Em
cada casa um oratório, em cada quintal uma oficina", no Espaço
Memória do Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas,
no bairro de São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Com a curadoria de
Emanoel Araújo, diretor-curador também do Museu Afro Brasil de São
Paulo, a exposição, de caráter evocativo, retrata sobre a lendária
figura de Padre Cícero em Juazeiro do Norte. A exposição apresenta
ao público a saga de superação do povo nordestino e da liderança
desse personagem religioso e também político. A devoção do povo,
as estratégias criadas por Padre Cícero e os milagres integram a
narrativa cultural da mostra.
A mostra, distribuída
nos dois andares do "Espaço Memória", faz uma narrativa
da presença lendária do líder religioso e político do Ceará,
reforçada no imaginário brasileiro por representações de artistas
populares. A devoção popular ao Padre Cícero Romão Batista
(1844-1934) é retratada em obras, ex-votos, objetos históricos,
artísticos e visuais de Padre Cícero, sob a inventividade e ótica
do sertanejo. Além dos objetos dos artistas e dos pertences do
Padinho Padre Cícero, o visitante pode conferir ainda uma
perspectiva histórica do líder regional, com relatos de
contemporâneos através da exibição do documentário mostrando os
feitos do Padre Cícero em Juazeiro do Norte e a grande comoção ao
redor do seu nome. Nos primórdios da romaria a Juazeiro do Norte,
aconteceu o milagre presenciado pela beata negra Maria de Araújo: ao
receber a hóstia consagrada do Padre Cícero, esta se transformou em
sangue.
O "Espaço
Memória", localizado no Pavilhão São Cristóvão, local
considerado o mais importante pólo cultural nordestino na cidade,
não poderia ser mais adequado para apresentar uma das sagas mais
célebres do povo do Nordeste. Entre os artistas expostos,
encontram-se os escultores Nino e Manuel Graciano Cardoso, a
ceramista Ciça (a qual, nos anos 60, esculpiu figuras de santos e
cenas regionais como festas populares), o xilogravurista Francisco de
Almeida e as Irmãs Cândido (autoras de peças inspiradas em
personagens de TV, figuras de livros e revistas). Folhetos de cordel,
oratórios e esculturas complementam esse painel artístico, além da
projeção de um documentário sobre a comoção em torno da memória
do "Padinho".
Ex-votos
Ex-votos: milagres do Padre Cícero |
Conhecidos
popularmente como "milagres" os ex-votos (do latim: "por
voto", "por promessa") são objetos variados
(pinturas, objetos em cera, placas com inscrições, figuras
esculpidas em madeira ou outros materiais) que representam a intenção
votiva (promessa) e sua posterior cura. Eles são a própria
materialização dessa cura. Ao expor essa grande quantidade de
peças, o curador chama a atenção dos visitantes quanto à
variedade, singularidade e poder de síntese, além da qualidade
estética nas peças de uso prático, demarcando a presença do
milagre.
"A exposição
dedicada ao Padre Cícero remete a quem visita o seu santuário na
cidade cearense de Juazeiro do Norte. A mística que envolve a
cidade, as pessoas, as igrejas e o próprio santuário faz deste
universo um espaço do sagrado. Essa atmosfera de pura religiosidade
vem atraindo romeiros pelos milagres do santo padre, essa grande
figura que persiste por mais de 150 anos na idolatria de muitos
nordestinos, atraídos ainda pela hóstia transformada em sangue da
beata Maria de Araújo e do caldeirão do beato José Lourenço
(1872-1946), destruído em 1937 por um bombardeio aéreo",
afirma o diretor-curador do Museu Afro Brasil, Emanoel Araújo.
Para Araújo, "esta
é a luta entre a religiosidade e os domínios dos latifundiários
que, de certa maneira, sempre tiveram conflitos nessa região
sagrada. Padre Cícero Romão Batista foi como todos sabem um homem,
um padre, um político, amigo de muita gente, inclusive de Virgulino
Ferreira da Silva, o Lampião. Essa exposição, portanto, revive um
dos mais interessantes episódios da vida cearense de Juazeiro do
Norte".
Na exposição,
gravuras, pinturas e esculturas de artistas populares.
Padre Cícero no
imaginário dos artistas populares
DIOMAR DAS VÉIAS (Diomar Freitas Dantas), "Sem título"- Óleo sobre tela. Acervo Museu Afro Brasil |
Nino (Juazeiro
do Norte/CE, 1920-2002)
Escultor. Trabalhou
como cortador de cana e como ferreiro e não recebeu educação
artística formal antes de iniciar suas atividades como escultor com
a produção de brinquedos em lata e madeira, tais como veículos em
miniatura. Passou depois à produção de figuras de macacos com
partes móveis e caudas de corda, que ele chamava de "dezessete"
(número do macaco no jogo do bicho). Por volta de 1980, após se
filiar a uma cooperativa de artistas, o que garantiu demanda mais
constante e diversificada, passou a aumentar as dimensões de suas
esculturas, algumas das quais ultrapassaram um metro de altura.
Ciça ou Cícera
Lira (Cícera Fonseca da Silva) (1935, Juazeiro do Norce/CE)
Foi por incentivo de um
tio que a fez ingressar na arte da cerâmica já aos 10 anos de idade
produzindo pequenas pecinhas que eram vendidas em algumas feiras,
dentre as quais a feira de Juazeiro do Norte. Durante os anos 60,
esculpiu figuras de santos e cenas regionais como festas populares e
aspectos da cultura cearense. A pedido de um folião, no carnaval de
1972, Ciça confecciona as máscaras pelas quais ela passou a ser
reconhecida como uma das grandes artistas populares do Brasil.
Francisco de Almeida
(Crateús/CE 1962)
Xilogravurista. Começou
a desenhar cedo observado o pai, que era ourives. Mudou-se para
Fortaleza aos 15 anos, onde estudou Xilogravura com Sebastião de
Paula e frequentou cursos de pintura na Universidade Federal do Ceará
e na Universidade de Fortaleza. Participou de exposições em
Fortaleza, Sobral, São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre,
Argentina e Espanha, com destaque para sua participação no Panorama
da Arte Brasileira do MAM (São Paulo, 2005), na Bienal de Valência
(2007) e na VII Bienal do Mercosul (Porto Alegre, 2009).
Especializou-se em xilogravura e realizou experimentos técnicos para
a produção de obras de grandes dimensões e xilogravuras
fragmentadas, capazes de produzir variações com a mesma matriz. Sua
produção se debruça principalmente sobre a religiosidade
nordestina.
Manuel Graciano
Cardoso (Sant.Cariri/CE, 1923)
Partiu com a família
para Juazeiro do Norte (CE) em 1929. Já aos dez anos trabalhava na
madeira esculpindo pilões, gamelas e brinquedos. Depois de casado,
começou a produzir ex-votos e presépios e trabalhou na agricultura.
Foi o xilógrafo cordelista Abraão Bezerra Batista que o revelou ao
público mais amplo, mas isso não o impediu de continuar trabalhando
como agricultor familiar. Possui obras no acervo do Museu de Folclore
Edison Carneiro (RJ). Participou das exposições Brésil, Arts
Populaires (Paris, 1987) e Mostra do Redescobrimento (São Paulo,
2000). Sua escultura, em madeira policromada, é composta de
conjuntos de personagens humanos permutáveis e de composições em
monobloco de madeira, nas quais prefere figuras animais. O artista
prepara suas tintas a partir da anilina misturada a breu e álcool,
aplicando as cores à imburana de cambão ou aroeira, madeiras que
emprega. Para Lélia Coelho Frota, "tem um veio de humor que
pode crescer até o mais flamejante expressionismo em muitos dos seus
trabalhos."
As Irmãs Cândido
- Juazeiro do Norte (CE)
Maria de Lurdes Cândida
(mãe) 1939. Tendo tido onze filhos, transmitiu às filhas mulheres o
ofício local "feminino" de trabalhar no barro. Filhos
homens como José Cícero Fonseca da Silva, o "Zé Ciço"
também seguem a tradição familiar. A pedido do xilógrafo Stênio
Diniz, Dona Maria de Lurdes variou o tema de sua produção artesanal
de boizinhos, panelinhas, bonecos humanos para placas de tabatinga
policromada, com cenas do cotidiano da praça da cidade, temas
religiosos católicos ou do candomblé em alto-relevo.
Maria Cândida
Monteiro 1961 - Juazeiro do Norte (CE) e Maria do Socorro Cândido
1971 - Juazeiro do Norte (CE). As Irmãs Cândido assinam seu nome
pelas iniciais MCM e MSC para distinguirem-se entre si. Além da
temática tradicional desenvolvida pela mãe, elas também produzem
peças cuja inspiração se apropria de personagens de TV, figuras de
livros e revistas, etc.
Serviço
Emanoel Araújo, curador da exposição e Walter Santos, secretário de cultura do município do Rio de Janeiro |
Meu Padinho Padre
Cícero - Em cada casa um oratório, em cada quintal uma oficina
Espaço Memória do
Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas - Campo de
São Cristóvão s/nº. Pavilhão de São Cristóvão - São
Cristóvão. RJ.
Visitação pública:
até 19 de agosto
Funcionamento: terça,
quarta e quinta-feira, das 10h às 18h. Sexta, sábado e domingo, das
10h às 22h. Entrada franca
*O Pavilhão de São
Cristóvão funciona gratuitamente de terça a sexta (até às 18h).
De sexta (a partir das 18h) até domingo, a entrada custa R$3,00.
Nenhum comentário:
Postar um comentário