Por Armando Avena
Karl Marx teve dois grandes amores: o socialismo e a baronesa Jenny von Westphalen, a moça mais linda de Trier. Mas o amor verdadeiro, já dizia Balzac, é impiedoso, e exige fidelidade. Ao socialismo, Marx foi inteiramente fiel, mas temia o que os homens fariam com suas ideias e, certa vez, ao ler o programa de um partido que se intitulava marxista, não hesitou: "se isso for marxismo, eu não sou marxista."
À Jenny, Marx foi fiel, mas à maneira dos homens, e havia Helene Demuth, a quem todos chamavam Lenchen. Jenny amava Lenchen, sua governanta querida, que com ela viveu desde os 25 anos e que era capaz de conter a impaciência proverbial de Marx e de, para seu desespero, vencê-lo no xadrez. Lenchen cuidou daquela família durante toda a sua vida, mas um dia, como disse Jenny em seu diário, "tudo naufragou no nada".
Os dois amores de Marx estavam com ele, no momento em que entrou na biblioteca do Museu Britânico sabendo que seria a última vez que o faria. Aquele lugar era como se fosse sua casa e estar ali foi como um bálsamo que lhe deu forças para fazer o que tinha de fazer. Amparado naquela que parecia ser sua última obstinação, Marx, pensava em Jenny e no socialismo, quando escondeu um manuscrito em algum local do museu e com tal rigor que somente à posteridade seria dado o direito de encontrá-lo. O que Marx teria dito no último texto que escreveu em vida?
Pesquisando sobre Marx, e aborrecido com as biografias que escondiam o lado humano e literário do grande pensador, resolvi escrever um romance em que ele fosse o protagonista. Mas como fazer literatura com um tema tão árido como a Economia? Foi então que descobri que no Brasil viveu um descendente de Marx e foi ele que uniu as pontas de uma história, de amor e suspense, que tem como eixo o último manuscrito escrito por Marx. Pus-me então a escrever a história, mas antes fui fisgado por um demônio que desejava transformar economia em literatura, e que me pôs frente a uma tarefa hercúlea, traduzida por uma sentença: só terá acesso ao manuscrito secreto de Marx aquele que for capaz de encontrar um tom literário para a Ciência Econômica. Foi assim que surgiu o Manuscrito Secreto de Marx, um livro engendrado pelo fascínio do Mouro e pelo desejo de deshermetizar uma ciência cujo objetivo, muito mais que a compreensão do fato econômico, é a compreensão do homem em toda a sua insana busca pela riqueza.
*Armando Avena é escritor e economista e membro da Academia de Letras da Bahia. Tem sete livros publicados, entre os quais destacam-se "O Evangelho Segundo Maria", o "O Afilhado de Gabo" e "A última tentação de Marx", todos publicados pela Relume Dumará.
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