Foi o Brasil fruto de uma ideologia: a das Descobertas, criada por Henrique, o Navegante, no século XV. A partir de então, a luta pela ocupação do território passou a fazer parte dessa ideologia inicial. Contudo, a derrota de Dom Sebastião em Alcacer-Kibir colocou Portugal em posição de inferioridade perante a Europa e, com a restauração da autonomia portuguesa em 1640, era necessário que se restaurasse também a esperança do povo. O intelectual mais importante de Portugal e Brasil na época, o Padre Antonio Vieira, tinha 12 anos menos do que Descartes: 8 anos menos do que Calderon de la Barca: mais 5 do que La Rochefoucault: mais 15 do que Pascal: mais 18 do que Boussuet. Era de novo tempo de transformação, de modo, contudo, diverso do das descobertas. Naquele momento, o povo que dominara a tecnologia de transição no século XV e, com isto, mudara o mundo, sentira urgência em voltar à tona. Vieira adotou então uma ideologia - a do Quinto Império - um sonho, uma utopia, que atribuía a Portugal o destino infalível de se tornar o Quinto Império da terra. Sem muita repercussão entre brasileiros, estava, mesmo assim, essa ideologia inserida na existencialidade normal da gente de fala portuguesa e, no século XX, um poeta como Fernando Pessoa ainda se curvaria sobre o assunto.
A ideologia que empolgou os brasileiros foi, em seguida, a da penetração no território, a das "bandeiras" e, como resultado prático, a do ouro e do diamante. A expulsão dos invasores ajudava a iniciativa das entradas, oficiais ou particulares, por favorecer o sentimento nativista da gente brasileira. A independência dos Estados Unidos, em 1776, e os tempos imediatamente anteriores à Revolução Francesa criariam a ideologia que levou à luta pela soberania. Esta, porém, só se efetivaria em 1822.
Depois da independência, estava o terreno pronto para o Positivismo, que viria a ser a ideologia por excelência do Brasil. Criado por Augusto Comte (1798-1857) não só a influência da cultura francesa no Brasil, mas o lado científico, ou cientificista, do Positivismo tinha tudo para atrair os brasileiros, que nele viram também uma religião, um misticismo com base na ciência, com força para erguer templos (Templos da Humanidade) em todo o país. Tanto no seu aparato burocrático e organizacional como na sua liturgia, assemelha-se o Positivismo à Igreja Católica, e nada mais entranhado na existencialidade do brasileiro do que a religião. O lado da honradez, da repulsa à corrupção, ia ao encontro de um povo que, já naquela época, vivia às voltas com um número incalculável, porque invisível, de corruptos. O Positivismo era, naturalmente, republicano e, com o estabelecimento da República Brasileira, a nova bandeira do país passou a ter um lema positivista, escrito em semicírculo sobre céu estrelado: "Ordem e Progresso". A influência do Positivismo iria pelo menos, ainda forte, até Getúlio Vargas chegar ao poder em 1930, e teve reflexos mais longínquos, atingindo o começo do regime autoritário de 1964. Odílio Denys, Castelo Branco, Juarez Távora, tinham marcas positivistas, e podiam representar o ainda ideal de pureza administrativa que estava embutido na ideologia de Augusto Conte. A gradativa queda na corrupção que o regime de 1964 começou a revelar foi elemento decisivo na deterioração dos governos de então e na sua conseqüente redemocratização.
A ideologia que, ainda no século XIX, ligada à da República, empolgou o país, foi a da Abolição da escravatura em que poetas e jornalistas assumiram o papel militante e decisivo. Na época do auge do Positivismo houve a reação de Tobias Barreto, cujas idéias, inspiradas pela filosofia alemã, equilibrava os excessos positivistas do país. A pregação de Tobias permanece até hoje, parte integrante de um setor do pensamento brasileiro, apesar do maniqueismo esquerda/direita das gerações posteriores ao período de entre-guerras.
Quanto ao número de corruptos, continua aumentando!
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