Alfredo Volpi

A alcunha "pintor das bandeirinhas", pela qual Alfredo Volpi é tão conhecido, longe de injustiçar seu talento, define uma das características mais importantes de sua obra: a influência das imagens de sua infância passada no subúrbio paulistano. As ruas enfeitadas nos dias de festa dos imigrantes foram representadas através da vida do pintor e englobadas por todas as suas fases evolutivas. Segundo Lorenzo Mammí, "Alfredo Volpi foi um homem quase iletrado, mas um pintor de grande cultura visual. Num país caracterizado por explosões artísticas de curta duração, produziu por quase setenta anos uma pintura de qualidade. Sua arte nunca deu saltos. Foi nessa digestão lenta, mais do que na indigestão antropofágica, que veio à tona um modelo convincente de arte moderna brasileira. O modernismo de Volpi é um modernismo da memória, afetivo e artesanal, de marcha lenta e voz mansa".
Nascido em Lucca, Itália, em1896, Volpi se transfere com os pais para São Paulo com um ano de idade e passa a viver em um dos muitos subúrbios de população predominantemente imigrante da cidade. Trabalha, a princípio, como pintor de paredes, mas aos 19 anos, autodidata, começa a dar mostras de seu talento executando afrescos nas paredes de várias residências.


Suas primeiras pinturas são simples e têm cores vibrantes. Segundo o livro A Pintura Brasileira, da Abril Cultural, "É o subúrbio paulistano, meio cidade, meio roça, que vive a cada instante na pintura do artista". Porém, é somente perto dos 30 anos que Volpi entra em contato com o ambiente das artes de São Paulo, participando da formação do Grupo Santa Helena, em 1935; do grupo de fundadores do Sindicato dos Artistas Plásticos de São Paulo, no ano seguinte e em 1937 integra a Família Artística Paulista.
O Grupo Santa Helena se formou com a instalação gradual de ateliês de artistas no Palacete Santa Helena, na Praça da Sé, que se tornou ponto de encontro para sessões de modelo vivo e discussões sobre arte. Os "santelenistas" eram, em geral, imigrantes ou descendentes de imigrantes de origem humilde e registraram em suas obras a vida cotidiana da cidade e seus arredores. Dele participaram artistas como Francisco Rebolo, Bonadei, Clóvis Graciano, Mario Zanini e Fulvio Pennacchi.
A Família Artística Paulista, liderada por Rossi Osir e Waldemar da Costa, contou com a participação de vários artistas, dentre os quais os membros do Grupo Santa Helena. Segundo Paulo Mendes de Almeida, a FAP "significou um poderoso estímulo à formação de uma consciência profissional nos jovens artistas brasileiros, especialmente nos de São Paulo, e representou, sem dúvida, um importante passo na evolução da arte moderna no país". O grupo realizou três exposições: em 1937, no Hotel Esplanada, em 1939 no Automóvel Clube, ambas em São Paulo, e em 1940, no Palace Hotel do Rio de Janeiro. Essas mostras, juntamente com o Salão de Maio, eram as principais exposições de arte moderna paulista na época. Entre seus integrantes mais ilustres estavam Anita Malfatti, Candido Portinari, Carlos Scliar e Clóvis Graciano.
Ao lado de alguns dos mais brilhantes artistas paulistanos de seu tempo, o talento de Volpi pôde se revelar e acabou sendo reconhecido. O pintor participou de numerosas exposições, coletivas e individuais e recebeu um Premio de Viagem ao Exterior no Salão Nacional de Belas Artes em 1950.
A oportunidade de sair do Brasil o leva à Itália, onde entra em contato com a arte renascentista, o que iria refletir-se em sua obra. Volpi jamais admitiu a influência de pintores ou movimentos sobre sua arte, mas alguns críticos apontam referências do pintor italiano Ernesto De Fiori em obras do fim da década de 30 e início da década de 40.
A partir da década de 50, passa a executar pinturas que gradativamente caminham para a abstração. É convidado a participar, em 1956 e 1957, das Exposições Nacionais de Arte Concreta e mantém contato com artistas e poetas do grupo concreto. Segundo Olívio Tavares de Araújo, "Do final da década de 40 para frente, a realidade já não surge sequer como estímulo, mas apenas como um repositório de imagens, um repertório iconográfico do qual Volpi retira formas avulsas existentes - portas, janelas, telhados, ruas, pátios, barcos, gradis, linhas do mar ou do horizonte - como se fossem signos abstratos. (...) Daí em diante, começa a série de fachadas; e com elas se abre a porta à pura abstração geométrica". Ainda sobre o tema, Sônia Salzstein diz que "no princípio da década de 1950, surgiram as primeiras pinturas de Volpi projetadas num espaço plenamente bidimensional. Sabemos que desde a segunda metade da década de 40, mesmo antes do advento pleno daquele espaço bidimensional, Volpi vinha lidando com a noção de superfície de uma posição quase solitária no meio de arte brasileira. O campo da representação se revelava reduzido a um repertório de elementos constantes, cuja função narrativa o pintor pacientemente limava, até que no abrir da década de 1950 eles viessem à tona em um jogo de elementos formais móveis e permutáveis, embora nesse processo jamais se perdesse a referência afetiva do subúrbio e não houvesse dúvida de que ali se tratava de uma retratada memória familiar de fachadas e janelas".


Em 1953, na II Bienal de São Paulo, vem a consagração: o prêmio de melhor pintor brasileiro, dividido com Di Cavalcanti. Ainda assim, Volpi continua se transformando: a influência do movimento concretista se faz sentir entre 55 e 57, sem, contudo, apagar as influências de sua origem. "Os retângulos da tela, em forma de xadrez, nada mais são do que uma recomposição das bandeirinhas esticadas ao vento nos bairros paulistanos em dia de festa. O subúrbio permanece e renasce, mesmo sob formas abstratas". Em 1958 recebe o Prêmio Guggenheim e é escolhido como o melhor pintor brasileiro pela crítica de arte do Rio de Janeiro em 1962 e 1966.
As retrospectivas do Museu de Arte Moderna do Rio, em 1957 e da VI Bienal de São Paulo, em 1961, além das participações na Bienal de Veneza, situaram-no como um dos pintores brasileiros vivos mais apreciados pelo público e pela crítica. Está presente no álbum de gravuras editado em 1971 sobre o Grupo Santa Helena. Em 1975, Olívio Tavares de Araújo realiza o documentário Alfredo Volpi. O pintor faleceu em São Paulo, em 1988, aos 92 anos de idade.

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